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domingo, 29 de maio de 2011

O Meu Desejo e a Vontade de Deus

          Roberto Albuquerque Santos


          A Bíblia nos afirma que Deus realiza os desejos de nosso coração (Sl 20). Obstante a isso, a mesma nos condiciona a orarmos em busca da vontade Dele. Afinal o que devo buscar? O que deseja o meu coração ou o que Deus tem preparado para mim? O que receberei? O que desejo ou o que Deus deseja?           
          O final do século XX foi invadido por uma pregação que tem como base a confissão positiva e, que de certa forma, incomodou (incomoda ainda?) não apenas tradicionalistas e conservadores do cristianismo no Brasil, mas até mesmo os Pentecostais: foi o movimento denominado Neo-Pentecostal.   
            

          Mesclado a essa “nova onda” de mensagem, pregadores de vários segmentos em busca de agradar seu público, despejaram (e ainda despejam) uma dose de entusiasmo e de motivação a ponto de levarem as suas platéias a acreditarem que são super-homens (crentes) e que não há dificuldade que não seja superada. Para tanto, essas pessoas utilizam passagens bíblicas onde o mar se abre; muros são derribados; onde a terra se fende e os inimigos são de todos destruídos em questão de minutos. É evidente que tais registros nas Escrituras são relatos históricos de fatos decorrentes de situações onde se fez necessária a intervenção divina naquele momento, mas isso não se caracteriza em uma regra.
           Ao analisarmos o ponto de vista dos tais, chegamos a uma conclusão que alguns princípios (Doutrinas)  Bíblicos são totalmente desvirtuados de sua essência e os ouvintes têm um prisma diferente do ensino das Escrituras.
Dentre os mais variados, podemos citar alguns pontos. Os mais atingidos são:
1 - A Fé - É apresentada como uma jóia rara e que os que a possuem, são capazes de alcançarem o imaginável. Dela e só dela depende a benção almejada; se o homem a possui, Deus está condicionado a atender a petição.
2 - A Graça - É trocada pela obrigação imposta a Deus por registros bíblicos onde o mesmo afirma cumprir a sua palavra, ou seja, o que recebemos de Deus não é por sua benignidade e compaixão, mas um cumprimento de sua obrigação em abençoar. Muito dessas "bênçãos" são ministradas aos adoradores em forma de barganha, por exemplo, "dar para receber" (se "damos" a Deus o mesmo fica obrigado a retribuir).
3 - A salvação - Não está mais condicionada no crer em Cristo, nem tampouco sua morte expiatória para o perdão dos pecados; a cruz foi trocada pela promessa de bênçãos e prosperidade e, a salvação, resume-se no simples acreditar que Jesus existe.
4 - O Espírito Santo - É o doador de uma força descomunal tornando o homem resistível às conseqüências da vida. Não o mostram como o Consolador, mas como o detentor de um poder como "de uma bomba atômica” (realmente não conhecem o Poder do Espírito Santo), e assim, Ele não é o que consola os crentes e sim o que os prepara para lutas constantes no mundo espiritual.
5 - O Evangelismo - Não visa preparar obreiros para a seara do Mestre, mas busca alavancar o número do censo evangélico da cidade ou até mesmo do país; os neoconversos são mais destinados a serem seguidores da denominação do que mesmo de Cristo; muitos são discipulados por pessoas inexperientes e sem conhecimento das doutrinas bíblicas.
            Além dos pontos acima citados, há inúmeros ritos, movimentos e sincretismos que podem ser identificados em sermões, tais como o gnosticismo, o ascetismo, e o misticismo. As liturgias por ora apresentadas em muitas igrejas se transformaram em verdadeiros ritos costumeiros e caíram em uma rotina tal que antes mesmo de se começarem os cultos já sabemos como vão findar. Muitos cultos de louvor e adoração passaram do intuito para os quais são designados para se transformarem em verdadeiros espetáculos com direito a "fumacinha" e "globos giratórios"; há "cantores" que ao invés de louvarem são louvados e aclamados. Tiram o brilho que devia ser do Cristo de Deus e não se importam de receberem estrelismo quando a eles são designados.

          É dentro dessa embalada frenética que a igreja do século XX mergulhou no século XXI: Uma multidão de gente descompromissada com o Evangelho do Nazareno e compromissados com suas idéias e maneiras de lidar com o público: A humildade foi trocada pela arrogância, a sabedoria pelo bom planejamento, a direção do Espírito Santo pela boa administração e a vocação ministerial por uma posição bem sucedida na sociedade.
            É preciso lembrar que não há humildade onde Jesus não é o Senhor absoluto; não há planejamento bem sucedido se não obtiver a aprovação divina, pois o mesmo depende de ter sido elaborado pelo Espírito Santo e este ter revelado aos homens a sua vontade e por meio deles realizar tanto o querer como o efetuar; uma igreja só terá uma administração sólida e frutífera quando o Espírito Santo tem o domínio nas vidas e quando os homens encarregados na administração da igreja são sensíveis a sua voz, presença e vontade. Ter vontade de administrar não quer dizer que tenha chamada para tal. Não é apenas um bom curso de administração que faz de um homem um líder de sucesso: é preciso ter vocação (principalmente se referindo as coisas de Deus).
            Mas qual a relevância de tais fatos em relação ao assunto abordado? A importância é saber a quem estamos disponibilizando as nossas vidas para administrarem a benção sobre nós. Precisamos saber se estamos sendo bem orientados ou não sobre a fé e sobre nossa vida cristã; se estivermos buscando saber de forma coerente ou não à vontade de Deus, ou se estamos sendo ensinados a gerenciar a ação divina sobre nós, "tirando" do Senhor as prerrogativas de Sua Soberania. Deus deu vida ao homem. Nossa existência não é uma vida inútil, mas um canal pelo qual Ele realiza seus propósitos em meio à humanidade. Por isso, precisamos saber discernir, como disse Paulo, "Qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus".

            Portanto, em nossas orações, não podemos ser egoístas e pensarmos só no que queremos sem nos importarmos com o que Deus "pensa" sobre o nosso pedido. Não podemos chegar diante dEle com prerrogativas e argumentos baseados em versículos pré-selecionados querendo fazer Deus prisioneiro de palavras registradas na narrativas bíblica. Narrativa essa onde Ele (Deus) revela a imensidão de seu amor pelo seu povo demonstrando, assim, uma graça imensurável da qual não somos dignos.
            Estou certo de que as bênçãos do Senhor são para nós e que como co-herdeiros com Cristo somos participantes das riquezas de sua glória, mas é preciso entender que também herdamos seus sofrimentos e dores, ou seja, não vivemos em um Evangelho mágico onde tudo dar certo e que jamais seremos derrotados e sempre teremos tudo simplesmente porque declaramos que o Senhor está conosco. É por Ele está conosco que sofremos, somos perseguidos, no entanto, jamais aniquilados.
            Há vários exemplos bíblicos onde os envolvidos na petição buscaram em suas orações uma intervenção divina na situação em que passaram ou uma resposta de forma a que fossem livres de tal situação vexatória ou de perigo. Há casos como o de Abraão, Raquel, Ana, entre outros, que esperaram uma providência divina para alcançarem um filho visto que, as condições físicas envolvidas (no caso de Abraão, Sara era a estéril) impossibilitavam o cumprimento da realização do desejo almejado. Nesses casos, vemos a resposta divina favorável aos mesmos. Deus cumpriu-lhes o desejo. Mas observando mais a fundo essas passagens podemos entender que o ocorrido estava fundamentado dentro de uma perspectiva divina, ou seja, Deus realizou uma obra por intermédio da resposta a essas orações (embora a Abraão tenha sido feita uma promessa).        
Vejamos:
- De Abraão descendeu Isaque do qual descendeu Israel e as doze tribos;
- De Raquel, esposa de Israel descendeu José, que foi governador no Egito e possibilitou a entrada dos seus irmãos à terra de Gósen no tempo de seca e fome em Canaã;
- De Ana nasceu Samuel, considerado o maior Juiz em Israel e o responsável pela transição do juizado para a monarquia.
            Por outro lado, vemos também exemplos de desejos não realizados, apesar de terem sido expostos diante de Deus em oração; Deus respondeu a oração, mas não concedeu o desejo dos mesmos, vejamos alguns exemplos:
- Moisés orou a Deus depois de ter sido informado pelo mesmo que não entraria em Canaã e Deus não realizou o desejo de seu coração.     
- Davi suplicou a Deus para que seu filho (o que teve com Bate Seba) não morresse, mas não adiantou.
- Paulo pediu em oração por três vezes para que O Senhor o livrasse de um "espinho na carne" e a resposta de Deus não foi a que lhe estava no coração (de Paulo).
          É evidente que ao analisarmos os dois primeiros fatos sentenciaremos o pecado dos mesmos para a não realização de seus desejos: Moisés desobedeceu e Davi adulterou e assassinou Urias por mãos de seus inimigos. Mas por que Paulo não foi atendido em seu pedido? Será que foi porquê perseguiu a Igreja? Estava Deus com rancor por causa de seus servos e não abençoou a Paulo? Não acredito nessa possibilidade.
          Quando aceitarmos a soberania de Deus em nossas vidas e oramos sem egoísmo; quando reconhecermos que de Deus vêm as bênçãos e que é por sua graça que as alcançamos e não porque a determinamos como uma confissão de fé positiva; quando entendermos o propósito divino para nós e deixarmos que o Espírito Santo nos ajude em oração nos revelando a vontade do Pai para nossas vidas, então estaremos começando a aprender a diferença entre os nossos desejos e a vontade de Deus.  

Sobre o Autor
Bacharel em Teologia formado na FAESP;
Bacharelado e Licenciado em História pela FIEO;
Palestrante, Conferencista em diversos eventos;
Professor de Teologia (IETEB - Osasco/ ITF - Embu);

Escritor de apostilas utilizadas na grade do IETEB, conforme abaixo:

- Curso Básico:  Introdução Bíblica; Antigo Testamento; Novo Testamento;
- Curso Médio: Cristologia; Livros Poeticos; Período Interbíblico
- Bacharel: Cristologia; Livros Poéticos;
- Outros: Bibliologia Geral; Arqueologia Bíblica;
Escritor de diversas Apostilas usadas em Palestras, Estudos e Seminários. Entre outros títulos, citamos: Escatologia; O Adolescente; Laços do Passarinheiro (voltado aos jovens); Liderança/Líder/Relacionamento com o Grupo; Não Sejais Meros Ouvintes (Estudo no Livro de Tiago).




terça-feira, 24 de maio de 2011

AS CIDADES GREGAS ANTIGAS: O FASCÍNIO SOB O OLHAR CRÍTICO DA HISTÓRIA

Roberto Albuquerque dos Santos                

  
          A presente análise não tem a pretensão de ser completa. Obstante, a tal pretensão, não deixa de considerar pontos que, a vista dos autores, se tornam paradoxais. Os mesmos ao escreverem sobre a região Ática, principalmente suas cidades, diferem em diversos aspectos, desde a temporalidade à estrutura física e social; política, organização urbana; cultura, artes e empreendimentos militares; religião; distribuição populacional, e outras características das cidades que, em seu tempo (tempo trabalhado pelos autores), compuseram a região citada.
          Assim, analiso alguns pontos discutidos nos textos, centralizando essas discussões no que concerne a estruturação do aspecto físico das cidades da região citada.

ANÁLISE DO TEXTO I

1.1 Texto I
1.2– Título: A Cidade na História: Suas Origens, Transformações e Perspectivas.
1.3– Subtítulo: (Capítulo VI) - O Cidadão Contra a Cidade Ideal
1.4– Autor: Lewis Mounford (sic)
1.5 – Análise das Subdivisões dos capítulos
          O texto (capitulo VI) de Lewis está dividido da seguinte forma:


1 - Cidade e cidadão – Lewis trata do relacionamento entre a cidade física e a cidade cidadã (construções X cidadania). Alude sobre a insignificância da cidade helênica do período abrangido no que concerne à arquitetura e planejamento de suas construções; fala da pólis, e com essa, o sonho de uma cidade ideal que estaria na vida de cada cidadão; também discute a idéia de cidadão livre e, de que, assim, tudo pertenceria a todos.
2 - A forma da Cidade Helênica – Aqui, a alusão maior se faz a Acrópole e sua estrutura, a cidade alta, a montanha sagrada onde ficava o Primateu, o fogo sagrado; a Ágora, que no sopé da Acrópole, constituía a cidade baixa e reunia seus cidadãos no ginásio ou na praça pública; trata da organização urbana como desordenado (ruas estreitas e tortuosas) e o saneamento precário e inadequado em sua maioria; aborda a higienização: os banhos públicos e privados, esse último, como sendo, provavelmente, rituais específicos.

3 - A Pólis Encarnada - Neste item, o cidadão é desvinculado da cidade. Ele é analisado a partir do que possuía como identidade cidadã e não a partir do que possuía materialmente. O autor enfoca a transparência social que se impunha aos cidadãos; fala de Sófocles e Sócrates como idealistas da integridade no século V a.C.; confronta a vida pública e a vida privada com suas atividades, exigências, funções, participações, etc; retrata a educação ateniense como inigualável na formação da cidadania; ainda destaca a transição de políticos e filósofos, suas idéias e aspirações; afirma que os gregos jamais criaram plenamente uma cidade a sua própria imagem, devido a Guerra Pérsica.
4 - Regressão a Utopia – É discutido aqui a intenção, ainda, de se ter uma cidade perfeita para cidadãos perfeitos (o que ele acha impossível, daí o termo “utopia”). O centro da discussão, portanto, fica por conta do bloqueio urbano. O autor comenta a geografia da região e, declara que “as montanhas já não podiam servir de muralhas (...) e a obscuridade topográfica já não bastavam para evitar que uma cidade fosse notada por Estados mais fortes e fosse apagada do mapa” (p. 191). Assim, fica subentendida sua intenção de informar que as cidades citadas não possuíam muralhas para proteção; outro fator negativo para o bloqueio urbano, segundo o autor, foi a gênesis de uma literatura que buscava delimitar a essência de uma comunidade satisfatória; cita que “Platão, na verdade, o tentou duas vezes em Siracusa –, no sentido de dar existência real a uma cidade ideal” (p.191); aponta a busca dos gregos ao planejamento urbano, para tanto, recorrem a Hipódamo, que teria dividido a cidade em tríade (cita Aristóteles, para tanto); levanta a questão de Platão e sua obra “A República”.
5 - O desafio da Dialética Grega – Aqui, Lewis destina-se a fazer uma crítica a Platão, concernente a sua visão perspectiva a pólis e, ao seu planejamento de disposição dos edifícios e casas da cidade; é incisivo ao chamar Platão de arcaico: “Admira-nos a cegueira de Platão. A cultura grega tinha em seu tempo, chegado a um ponto de desenvolvimento que tornava necessário desafiar as formas arcaicas até então personificadas na cidade (...) Eram essas as visões nascentes dos grandes espíritos do século V. Platão não desempenhou papel algum nessa reavaliação do ‘modo grego de vida’ tradicional” (p.201), e “sua prematura cristalização nas formas arcaicas da cidade. Seu esforço resultou apenas numa tentativa de tornar a própria cidadela mais segura, contra a usurpadora cidade democrática (...)” (p.202).  

ANÁLISE DO TEXTO II
2.1 Texto II
2.2 – Título: História da Grécia
2.3 – Subtítulos: (Capitulo III) – A Grécia e os Reinos Egeus
(Capítulo VI) – Atenas e a Ática de 800 a 600 a.C.
2.4 – Autor: M. Rostovtzeff.  



          Os textos de Rostovtzeff, por sua vez, não estão divididos em subtópicos. O autor abrange a cada capítulo o assunto em questão, debatendo de forma ininterrupta, porém de forma progressiva e concisa, os temas por ele dissertados.

 
          No capítulo III ele discorre sobre a historicidade dos Egeus; suas origens, a geografia da região, a vida em sociedade (Cretenses, Micênios e Egeus), construções (edificações), religião, arte, comércio, organização política, os meios de produção a partir da propriedade rural, da pecuária e manufatura, etc. Ademais, a tais informações é adicionado um total de VII pranchas (fotos com informações arqueológicas), e figuras (desenhos) com o propósito de elucidar informações contidas no texto. Esse período ele situa entre os séculos XV e XIII a.C.
          No capitulo VI os temas abordados consistem em uma análise de como Atenas chega a liderança da península da Ática. Em primeiro momento, ele tange seu foco às diferenças entre as cidades de Atenas e Esparta (comércio e unificação política), sendo que a primeira, por acordo comum entre as cidades da região, torna-se “(...) o único centro de vida política, econômica e religiosa” (p.99), trazendo unificação à península. Destarte, entre outros temas, segue Rostovtzeff tratando do governo tripartido (Rei, Polemarca e Arconte), sobre as transformações sociais do período, divisão das obrigações militares, da economia, da criação de um Estado Democrático (fim das instituições dos clãs), disserta sobre Drácon e Sólon, sobre o conselho dos anciãos (Areópago), o governo de Pisístrato, o enfraquecimento do poder aristocrático, sobre o comercio e a política externa, a homogeneidade do exército ateniense (absorção de mercenários citas), as mudanças políticas feitas por Clístenes, a substituição das fratrias pelos demos no processo eleitoral, o orgulho dos atenienses com a sua cidade, etc. O capitulo traz três figuras ilustrativas: O palácio de Tétis, mulheres com cântaros e, uma alusão a Ulisses em seu navio, quando tentado pelas sereias (Homero). O período aludido (do texto) situa-se entre os séculos IX e VII .a.C.

PONTOS DE DISCUSSÃO  
          Dentre os diversos pontos de discussão, encontrados nos textos, pode-se destacar o que os autores explanam sobre a constituição física das cidades egéias na Ática.

 
          Lewis começa sua dissertação afirmando que “Pelo fim do século VI, a cidade helênica começara a tomar forma; (...) Até o século IV, a mais orgulhosa das cidades da Ática, senão da Ásia Menor, era pouco melhor que uma cidadezinha (...)” (p.177). A datação exposta, embora se refira a estrutura da cidade (casas, ruas, etc), não deixa de ser determinista. Sua intenção também é mostrar que as cidades da Ática não eram tão esplendorosas como relatam muitos historiadores, poetas e admiradores da região; “O retrato da verdadeira cidade helênica, que nos chega de Atenas (...) contrasta com o branco esplendor que J.J. Winckelman e seus sucessores tendiam a interpretar (...) Na verdade, a cidade visível, a cidade tangível, era cheia de imperfeições: (...)” (idem).
          Diferentemente de Lewis, no livro História da Grécia, no capítulo VI, Rostovtzeff intercala o surgimento das cidades entre 800 e 600 a.C., ou seja, ele não afirma uma data especifica, mas a intercala num período quando ressalta que “Na Grécia, entre 800 e 600 a.C., surgiu, lado a lado com Esparta (...) a cidade Estado de Atenas, o centro econômico e político da Ática” (cap. VI, p.97). Rostovtzeff não entra em detalhes sobre as características físicas da cidade, mas chega a afirmar que a cidade ou região da Ática, embora não fosse grande, possuía uma riqueza natural considerável.
          Quando Rostovtzeff detalha cidades, faz referindo-se as cidades egéias, mais particularmente aos cretenses e micênios (ilhas). As populações gregas (que ele chama de colônias), todavia, afirma ele, que essas cidades egéias (e ele coloca essa temporalidade a dois mil a.C.) as que estava localizadas na orla marítimas (continente) eram fortificadas e “cada uma delas tinha muralhas de pedra, com palácio real (...) e moradias para os súditos do lado de fora das muralhas” (p.40). E ainda: “(...) a colônia se transforma numa cidade que rapidamente assume uma aparência organizada e civilizada. Tem ruas pavimentadas, casas de vários andares, esgotos, e outros dispositivos sanitários (...)” (p.42).
          Embora a temporalidade não seja a mesma que Lewis trata em seu texto, Rostovtzeff afirma que já desde vinte séculos a.C., as cidades na região Ática eram estruturadas; Lewis sempre busca descaracterizar essa estruturação. Diz ele: “Mas não existia calçamento para evitar a lama na primavera ou a poeira no verão (...) Nas cidades menores do século V, a escassez, quando não a ausência absoluta de melhoramentos sanitários era escandalosa, quase suicida (...) Os escavadores modernos não têm desenterrado indicações de melhoramentos sanitários da moradia helênica (...)” (p.183).
          Certamente, as narrativas diferem em pelo menos cinco séculos de uma sociedade a outra. Contudo não passa despercebido o fato de que a sociedade mais antiga fosse mais desenvolvida que a posterior. Lewis argumenta que o fator para a aglomeração nas cidades (e posterior degradação da própria cidade, principalmente Atenas) teria sido a guerra do Peloponeso em 432, que, nesse tempo, ter-se-ia dado como que uma explosão populacional na própria Acrópole: “(...) os refugiados eram forçados a acampar na Acrópole, desafiando as válidas advertências contra aquela imunda concentração, proveniente da própria Delfos” (idem). Mas esse fato, o da guerra do Peloponeso, Lewis não se detém a articular como argumento de suas afirmações para a estrutura precária da cidade analisada por ele. Ele cita a guerra de forma superficial, indireta, causal; a superpopulação na Acrópole é resultado da “(...) grande praga ocorrida na Guerra do Peloponeso (...)” (idem), contudo, para ele, não parece ser a guerra o fator decisivo dessa desestruturação da cidade, pois ele não volta a se referir ao tema da guerra e se atém novamente a evidenciar a precariedade da cidade: “Isso indicaria que pelo menos algumas das casas tinham provisões sanitárias privadas, embora em parte alguma tenha eu encontrado quaisquer referências à posterior deposição de matéria fecal (...) ‘um homem esvazia seu ventre no Pireu, perto da casa onde acham as moças más’, não havendo dúvida, pois, quanto à naturalidade e à falta de sentimento de vergonha no desempenho de tais funções corporais” (p.184), afirma ele. Em contrapartida, referindo-se ao governo de Clístenes (502 a.C - época contemporânea a época a que Lewis discute a cidade grega.) –, no capítulo VI, Rostovtzeff afirma que “Nenhum grego era tão orgulhoso da sua cidade e do seu país como o ateniense (...)” (p.111).
          Enquanto Lewis é critico incisivo à estrutura das cidades da Ática (e todo seu texto tem um aspecto crítico), Rostovtzeff é analítico e ponderado em suas afirmações. Isso nos faz ter uma visão mais panorâmica acerca da região em seus diversos estágios temporais e de estruturação, tanto física como conceitual. 

Sobre o Autor
Bacharel em Teologia formado na FAESP;
Bacharelado e Licenciado em História pela FIEO;
Palestrante, Conferencista em diversos eventos;
Professor de Teologia (IETEB - Osasco/ ITF - Embu);
Escritor de apostilas utilizadas na grade do IETEB, conforme abaixo:
- Curso Básico:  Introdução Bíblica; Antigo Testamento; Novo Testamento;
- Curso Médio: Cristologia; Livros Poéticos; Período Interbíblico
- Bacharel: Cristologia; Livros Poéticos;
- Outros: Bibliologia Geral; Arqueologia Bíblica;
Escritor de diversas Apostilas usadas em Palestras, Estudos e Seminários. Entre outros títulos, citamos: Escatologia; O Adolescente; Laços do Passarinheiro (voltado aos jovens); Liderança/Líder/Relacionamento com o Grupo; Não Sejais Meros Ouvintes (Estudo no Livro de Tiago).
Email: pr_robert@itelefonica.com.br

domingo, 1 de maio de 2011

A CONQUISTA E O PROCESSO DE COLONIZAÇÃO DA AMÉRICA LATINA

Roberto Albuquerque dos Santos

           Quando os Espanhóis chegaram à região onde hoje se localiza o México, se depararam com um Império muito poderoso tanto militar, quanto culturalmente. Eram os Astecas.
Inicialmente, os contatos se deram sem grandes conflitos e só após a morte do governante Asteca, Montezuma, em 1520, é que se iniciou uma guerra aberta entre Espanha e México. Hernán Cortez, o responsável pela empresa da conquista da região para a Espanha, já havia conseguido a aliança de quase todas as etnias que compunham o Império e que, dessa forma, eram exploradas pelos Astecas. Sendo assim, em meados de 1521, Tenochtitlán foi retomada pelos Espanhóis que haviam sido expulsos e, em 1525, totalmente destruída para que por sobre seus escombros fosse construída a capital do Vice-Reino da Nova Espanha: a Cidade do México.

Depois da conquista do Império Asteca (também chamado, como já foi referido, de México), os Espanhóis rumaram para o sul e, só depois de muita luta, no final do século XVI, conseguiram conquistar a península do Yucatán, região habitada pelos Maias, que não estavam subordinados aos Astecas e que também não estavam unidos em nenhum tipo de país ou Império, sendo assim, tornaram sua conquista um empreendimento bem mais trabalhoso.
A conquista da América mudou as concepções existentes até então de que os autóctones ameríndios seriam algo abaixo dos seres humanos, na medida em que não eram “civilizados”. A conquista de um Império tão elaborado quanto o Asteca (cuja organização interna era mais bem organizada do que a organização interna de muitos Reinos europeus da época) provou ao mundo e, em especial à Igreja, que os povos da América eram sim humanos. Essa comprovação se deu através da vitória dos argumentos do Frei Bartolomé de Las Casas, que acreditava no fato dos ameríndios serem criaturas passíveis de salvação e que, portanto, deveriam ser catequizados na fé Cristã. Porém havia quem declarasse que os índios eram macacos belicosos e que, por isso, precisavam ser destruídos.
Com a descoberta de que povos americanos conheciam a escrita, a Igreja mais do que depressa organizou autos de fé nos quais foram queimados a maior parte dos livros e pergaminhos Maias e Astecas, além da totalidade dos livros de outras culturas menores. Essa prática visava destruir mais rapidamente a cultura e, em especial, a religião daqueles povos para que o trabalho dos sacerdotes Católicos se desse mais facilmente. A destruição de tais obras sob a alegação de que se tratava de símbolos e rituais demoníacos; alegação essa, baseada no fato de que boa parte desses povos praticava o sacrifício humano com alguma regularidade. Tal atitude dificultou imensamente o trabalho dos arqueólogos e historiadores de hoje que buscam entender como se dava a vida naquelas regiões, além disso, fez com que fossem perdidos para sempre muitos dados valiosíssimos sobre tais culturas.
Mas o que se buscará nesse trabalho procurar  entender  como  se articulou  o  domínio e a colonização  da   América   pelos   espanhóis   com  o processo de acumulação de capital nas metrópoles européias.
A montagem de uma complexa máquina burocrática nas colônias tinha o evidente interesse de fiscalização, para assegurar a dominação das colônias. Através do monopólio, ou “exclusivo”, a Coroa garantia que os lucros gerados pela colônia permaneceriam na metrópole. Além dos monopólios, os impostos, muitos e variados, garantiram plenamente essa acumulação. Sem dúvida o trabalho realizado nas terras da América tinha como principal objetivo criar um fluxo de recursos a ser acumulado na capital da coroa.
Elementos que proporcionaram a vitória dos espanhóis sobre o império Asteca
A conquista da América é um dos mais importantes fatores que compõe a História Medieval. Fugindo do panorama europeu (embora os mesmo se encontrem no recém descoberto continente), o imaginário se eleva as paisagens de matas, montanhas e cerrados com selvas infestadas de ameríndios que desconhecem a cultura do invasor, mas que tem encravado consigo sua cultura, religião etc.
É inevitável o confronto desses dois mundos desconhecido um ao outro: invasor versos habitante local. Os invasores são em menor número, os habitantes nativos infestam o continente: Por que os invasores conquistam se são inferiores em número?  A este fato Todorov formula um questionamento: “Por que esta vitória fulgurante, se os habitantes da América são tão superiores em número a seus adversários, e lutam em seu próprio solo?”.[1] As respostas são várias, e entre tantas é necessário destacar o enorme poder de fogo das armas européias, às quais os índios só podiam contrapor com arcos, flechas, lanças e tacapes. Também é considerável o fato que os índios não conheciam o cavalo, como diz Elliot: “O cavalo deu aos espanhóis uma vantagem importante, em termos tanto da surpresa inicial quanto da mobilidade (...) Os invasores também tiraram enorme proveito do fato de pertencerem a uma sociedade de incontestável superioridade tecnológica sobre as sociedades indígenas” [2]. Importa ressaltar também que os mitos religiosos de alguns povos contribuíram, na medida em que previam a volta de “deuses” que foram identificados com os espanhóis: “Quando viram os espanhóis pela primeira vez, os índios (...) chamaram os espanhóis de Tucupacha, que significa deuses, e Teparacha, (...) também empregado para designar deuses [...]” [3]. Assim, um misto de misticismo e fatalismo colaborou para que os indígenas aceitassem a derrota ou talvez não resistissem tanto aos espanhóis.

O mesmo autor não só destaca as vantagens bélicas dos espanhóis, mas também destaca as vantagens dos índios. Chama ele a atenção para o fato de que os índios “(...) possuíam a grande vantagem de operar em terreno conhecido, ao qual os espanhóis ainda tinham de aclimatar-se” [4]. Além do mais, contava também a favor dos silvícolas, os efeitos do calor e as diversas reações da alimentação e bebidas as quais os espanhóis não estavam acostumados e as pesadas armaduras que os mesmos usavam. Outrossim, havia a fragilidade da pólvora junto à água e a eficácia dos fuzis ante as flechas dos nativos. O texto alude que “a superioridade técnica não foi tão bem definida e irrestrita quanto poderia parecer à primeira vista (...) os invasores estavam mal equipados (...) estavam armados com nada mais sofisticado do que espadas, piques e facas (...) treze mosquetes, junto com dez canhões de bronze e quatro canhões leves (...) com enorme dificuldade puderam esse canhões ser puxados pelas florestas e montanhas [...]” [5] .
Obstante as adversidades encontradas pelos espanhóis, o autor do texto ressalta que “Quando um mundo de ferro e pólvora entra em violenta colisão com um mundo de pedra, era de esperar que a derrota deste último fosse inevitável” [6]. Portanto, valendo-se da “alta tecnologia” bélica européia e até de fatores pertencentes às crendices e superstições dos índios, os espanhóis derrotam o povo nativo estabelecendo, assim, seu domínio sobre a terra descoberta.
Quanto a este ponto, Todorov busca “encontrar uma resposta na abundante literatura que esta fase da conquista, já na época, suscitou: os relatórios do próprio Cortez, as crônicas espanholas (...) e, finalmente os relatórios indígenas (...)” [7]. Por essas fontes, Todorov adiciona mais um fator a conquista: o comportamento de Montezuma. Para ele a razão que mais se destaca entre outras, para a conquista espanhola sobre os astecas é o fato de Montezuma não se opor a Cortez. Afirma ele que, Montezuma, apresenta “(...) um comportamento ambíguo, hesitante (...)” [8]. Um outro fator citado é a “(...) exploração que Cortez faz das dissensões internas entre as diversas populações que ocupam o solo mexicano”[9]. Ou seja, Cortez não fez uso apenas da artilharia, da superstição ou religião asteca para vence-los. O uso da passividade que Montezuma demonstrou para com os espanhóis e os levantes ocasionados entre diversas tribos foram fatores estratégicos usado por Cortez na conquista.  
O problema da comunicação no processo de conquista
            Além do que já foi posto no desencadeamento do processo de conquista pelos espanhóis, concernente aos Astecas, não se pode ignorar ou desprezar a formulação da comunicação das duas sociedades em questão. Os astecas eram dados a um aglomerado de símbolos que formam uma complexa linguagem para suas interpretações do cotidiano em seus diversos aspectos, desde a vida familiar as táticas de guerra. Os índios fazem uso de adivinhações, como por exemplo, a adivinhação cíclica que compõe seu calendário de treze meses, que é de suma importância para avaliar as ações dos homens, pois segundo eles “(...) Saber a data de nascimento de alguém é conhecer seu destino [...]” [10]. Uma outra forma de adivinhação era o presságio. Nessa forma, “Qualquer acontecimento que saia um pouco do comum, afastando-se da ordem estabelecida, será interpretado como prenúncio de um outro acontecimento, geralmente nefasto” [11]. Assim, adeptos dessa forma de comunicação que se enraíza mais com o mundo que com o individuo, que se embasa nos símbolos místicos e religiosos, que tem um caráter mais coletivo que mesmo individual, os astecas diante dos espanhóis não sabem o que fazer, pois para eles o fazer depende do saber, do conhecer os próprios presságios e dos agouros que estão sobre os inimigos. Nesse contexto, os espanhóis exercitam a comunicação entre si; é a interação de individuo a individuo; é o elemento do grupo interagindo com o grupo. Já os astecas, em sua sociedade, estão acostumados a confiarem seu cotidiano a alguém “que interpreta o divino, o natural e o social através de indícios e presságios, com o auxilio do profissional que é o sacerdote-adivinho” [12]. Esse é um aspecto que pode explicar a reação não só do próprio Montezuma, mas dos índios diante de seus algozes, ou seja, “(...) as profecias exercem um efeito paralizante (sic) sobre os índios que têm conhecimento delas e diminuem-lhes a resistência (sic) (...)” [13].
            Por outro lado os espanhóis, ao deparar-se com os nativos, terão uma interpretação de superioridade diante dos mesmos. Irão considerá-los como bárbaros, “(...) não chega nem a ser um homem, e, se for homem, é um bárbaro inferior; se não fala a nossa língua é porque não fala língua nenhuma, não sabe falar, com pensava Colombo” [14]. Se por um lado os astecas recorrem aos deuses para saberem como agir diante dos espanhóis, e entregues as fatalidades descritas por presságios e profecias religiosas envoltas de pessimismo e desmotivação, pois a luta parecia improdutiva, assim, são derrotados mais por suas crendices que mesmo pelo arsenal dos espanhóis. Já estes, achando-se superiores em cultura e humanidade, desprezam os nativos como humanos e portadores de cultura própria. 

As continuidades no processo de conquista e características da economia adotada
            A vitória de Cortez sobre a nova terra já é um fato consumado. As relações de paz ou guerra, conflitos ideológicos, racistas e culturais fizeram parte de um processo que, ao menos os europeus, souberam tirar partido de uma confrontação primeira, de um relacionamento primário entre dois povos que (se acredita) se desconheciam por estarem separados pelo imenso mar e pela ignorância marítima do além horizonte.
            Obstante a conquista, a forma pela qual se realizara deixaram marcas que até o inicio do século XIX ainda eram relevantes. O feito heróico dos europeus que, em busca de ouro para encher os cofres de Castela, se depararam com silvícolas e, de forma sutil ou não, não só se apropriaram da riqueza dos índios como os venceram em batalhas e ainda mais, os escravizaram às minas e nos campos, nos sistemas de Mita e Encomienda.
            O sistema implantado na colônia espanhola é avaliado como débil, porém capaz de sobreviver a tal qualidade. Ainda no século XVIII, era vista como caduca, ou seja, uma estrutura arcaica. Concentrava-se, tão somente em acumular riqueza com o mínimo de investimento possível. Isso acarretou conseqüências para o sistema comercial entre Espanha/Índia, ou seja, os custos na participação da Metrópole tornaram-se elevadas. Tal sistema levou “(...) a supremacia econômica concedida aos representantes locais da economia metropolitana, o fisco e os comerciantes que asseguravam as ligações com a península; e, (...) a manutenção quase total dos demais setores da economia colonial (...)” [15]. Isso evidencia vantagens a Metrópole espanhola e desvantagens aos setores que foram dominados na colônia. Mesmo assim, os colonizadores continuaram a administração econômica em favor de Castela na terra conquistada. Essa economia não estava apenas nas minas de ouro, mas estendeu-se para agricultura, e artesanato. Os indígenas eram “encomendados” e levados para longe de suas tribos para trabalharem e, por não conseguirem pagar os tributos aos seus donatários, muitos ficavam impossibilitados de retornarem ao seu lugar de origem. Um outro fator de economia barata é a imposição aos índios de trabalho forçado na industria de mineração e têxtil (a Mita).

            A diminuição da população (por conseqüência dos sistemas adotados) irá provocar uma catástrofe demográfica no século XVII. O setor agrário é afetado e há uma substituição da agricultura pela pecuária (caso do México). Segundo Donghi, isso tem aspectos feudais, pois os europeus que, passam a substituir os indígenas no trabalho, começam a exigir a “(...) bacienda, unidade de produção agrária dirigida pelos espanhóis” [16]. Em fins do século XVII, a colônia que estava sob pacto comercial, vê-se diante de uma reforma que visava trazer estabilidade e liberdade de comércio entre Castela e as Índias. Essas reformas resumiam-se na admissão da Metrópole que o ouro não era a única contribuição da colônia e, que, as colônias poderiam ser usadas como mercado de consumo. A reforma comercial consolidou e promoveu modificações na economia colonial, porém de forma limitada. Essa reforma visava dificultar o comércio entre as colônias objetivando, assim, o comércio direto com a Metrópole. Mas a própria Metrópole não tem força suficiente para fornecer produtos industriais aos seus domínios imperiais. Ademais “o novo pacto colonial naufraga, fundamentalmente porque a Espanha consegue apenas se transformar numa pesada e onerosa intermediaria entre as suas Índias e as novas metrópoles econômicas da Europa Industrial” [17] .

As relações Madrid/Hispano-América e o problema da falta de integridade regional e seu relacionamento com o Brasil
            Como conseqüência das reformas e do número constante de europeus na América, e pelos mesmos disputarem palmo a palmo uma parte de terra para sobreviver, invadindo assim áreas já delimitadas, ocorre o crescimento do sentimento de descortesia pela Metrópole. Os próprios europeus instalados na colônia e que retiam cargos administrativos sentem-se isolados da coroa. Disso pode-se concluir que a implantação da sociedade hispano-americana se deu de forma desigual. Referindo-se a distribuição da população, Donghi ressalta que “(...) a distribuição desigual era imposta em parte pela geografia” [18].
            Mas o mal estar não estava apenas centrada na má distribuição dos lotes. A população urbana também estava descontente com os administradores e com os clérigos. Além do mais não se concebia esperanças de elevação social a população. Pesava nessa relação também o destino do fruto do trabalho produzido na colônia. Havia uma classe alta que “(...) é escandalosamente rica e sua prosperidade contrasta com a profunda miséria popular” [19].  Essa classe estava concentrada especialmente no México, região de maior desenvolvimento. Mas apesar de tal produção, que chegou a ser superior a da própria Metrópole, não é repassada aos trabalhadores de maneira digna, antes se concentra a uma distribuição privilegiada a algumas pessoas; ademais, noventa e cinco por cento da prata produzida anualmente no México era direcionada à Metrópole. Apesar de receber as riquezas da colônia, a Espanha não investia capital na modernização dos artefatos industriais, ou mesmo, direcionava parte dessa riqueza para o bem da colônia.
            Paralelo às colônias espanholas, ou seja, situado na América do Sul, o Brasil, colônia portuguesa, é alvo no século XVIII de transformações que não são observadas nessas outras colônias de Castela. Nessa colônia, a produção de açúcar ao norte é transferida para a área central e a exploração das minas (na mesma região), desde o século XVII, se torna ponto de confronto entre os colonos e os cobradores de impostos da coroa. Boa da produção era transferida a Portugal. Ao norte, no Maranhão, a produção nos campos de algodão é um fator de desenvolvimento da região. Ao sul, dar-se-á um aumento da pecuária.
            No entanto, século XVII, a produção açucareira tinha um monopólio nas mãos de Portugal/Espanha e de uma parte do Brasil colonizado por espanhóis. Contanto, com a invasão da Holanda no norte do Brasil e sua subseqüente expulsão (principalmente pelos sesmeiros pernambucanos e baianos), os holandeses aportam nas Antilhas e abrem concorrência a industria do açúcar, promovendo assim, a decadência dessa produção econômica brasileira.
            Como na relação espanhola com suas colônias, Portugal também não investia nas técnicas utilizadas na produção de sua colônia. O Brasil se via a produzir açúcar com uma organização arcaica, ultrapassada e com técnicas também inseridas no mesmo contexto. Essa industria sobreviverá paralela ao expansionismo de outras atividades no Brasil. Enquanto a união Ibérica esteve em vigor (até 1640), a economia brasileira susteve-se; após a separação, o Brasil ver-se em dificuldades a manter comércio com as colônias espanholas. Mesmo assim, provinda de Potosí, prata é comercializada no Brasil através de um comércio de troca, considerado clandestino, mas com um volume permitido entre colônias espanholas e portuguesas, assegura que o Brasil possa comercializar esse metal.
            Um outro fator que diferencia a economia do Brasil da espanhola é que o Brasil não se servia apenas da mão de obra indígena, mas também de escravos africanos. Para defender a produção primeira da economia açucareira, a caça ao índio se desenvolveu, até mesmo na crise recessória. Mas, diferentemente dos espanhóis, Portugal absorverá em sua colônia a mão de obra advinda da África e institui a escravidão no Brasil, isso irá incluir no Brasil uma cultura e mestiçagem heterogênea até hoje existente. Essa obtenção de mão de obra escrava tanto ritmou a produção nas minas como também trouxe um fluxo considerável no censo demográfico populacional no território brasileiro no final século XIII.
            Semelhante às colônias espanholas, a colônia portuguesa na América também enfrentou reformas administrativas. E de igual modo só obteve êxito em algumas regiões. O marquês de Pombal implantou no Brasil um processo de investimento para o desenvolvimento da agricultura brasileira. Esse processo visava um sistema a beneficiar companhias comerciais. O fracasso foi relevante, principalmente na industria açucareira que só conseguia difundir sua produção em um mercado já existente. Como nas outras colônias espanholas, as posses de terra eram doadas a classe aristocrata que “(...) não estava disposta a ceder o controle do mercado local a uma companhia de ultramar” [20]. Essa resistência se dava no Norte/Nordeste brasileiro, já que, no rio de Janeiro existia um grupo de aristocratas ligados ao mercado ultramar, contrário a existência de tal fato nas colônias espanholas.
            Concernente a administração da colônia, Portugal se ver em desvantagem frente à Espanha. A estrutura econômica portuguesa bem mais desestruturada que a espanhola, e isso é demonstrada pelas relações sociais. Portugal (assim como também a Espanha), não consegue conciliar exploração e conquista. A relação do Brasil como colônia com Portugal é de simples estabelecimento comercial ou fonte de produção aurífera ou açucareira a suprir as necessidades dos europeus (embora seja vista como escassa essa produção). Outro fator é a estrutura administrativa: tudo provinha de concessões políticas. A possessão de terra dependia da coroa, que, segundo suas prerrogativas, distribuía (doava) lotes para comerciantes portugueses explorarem a colônia. Isso traz sem dúvida a expansão demográfica colonial, pois a implantação de famílias no território levava ao aprofundamento nos sertões, e o aumento de vilas urbanas.
            A relação hispano/americana com a situação do Brasil colonial é bem resumida na interpretação de Donghi: “Todas essa diversidades nos levam a uma diversidade essencial: na América espanhola, a propriedade da terra e a riqueza nem sempre estão legadas; no Brasil, ocorre o inverso, e, por isso, a classe dominante dispõe de um poder que falta freqüentemente à sua congênere da América espanhola” [21].    

A América Latina atual sob a perspectiva da herança colonial
            Não há como negar a influência do sistema adotado pelas metrópoles colonizadoras sobre suas colônias até os dias atuais. Desde os dias em que os europeus aportaram no continente recém descoberto, o ritmo do curso, até então natural dos habitantes nativos, sofreram alterações com a absorção do desconhecido, desde o âmbito cultural até o religioso; ainda mais aspectos trabalhistas (se não tão diferenciados dos aplicados principalmente na América espanhola) de escravismo, de exploração e aniquilação da mão de obra pela debilidade física, etc.
            Os meios utilizados pelos paises ibéricos a suas colônias já as deixaram debilitadas em todos os aspectos. O processo de vampirismo das riquezas da terra desde as naturais, minerais, físicas e até culturais, são de uma conseqüência até hoje vivida nos paises latinos. A herança que a América Latina – e essa herança é colonial – está intrinsecamente relacionada aos princípios econômicos de exploração já existente na colônia, que sobreviveu até os dias atuais, apontando para um endividamento que é fruto de mentalidades retrogradas deste contexto colonial que, de forma indutiva, monopolizara o sistema numa administração subjetiva.
            A independência conquistada pelo bloco dos países andinos, platinos, antilhanos e sul atlântico, trouxe aos mesmos (embora independentes um do outro) uma autonomia política, social e econômica, que é - aparentemente - um tanto superficial. Embora esses países tenham desenvolvido ao longo do tempo uma diversidade de planos econômicos e administrativos, não conseguiram recuperar-se da sangria generalizada imposta pelas metrópoles na época colonial. Os países latinos trazem em seu bojo uma divida aos países saxônicos de difícil perspectiva de saldar seus compromissos.
            Além do fator econômico, um outro que se destaca é o da catequese religiosa. Os latinos se viram invadidos por costumes, ritos e tradições alheios a sua conduta nativa. Seus deuses e seus cultos foram paganizados e ridicularizados; suas cidades sagradas, seus templos e altares foram derribados e sobre suas cinzas foram construídos templos da religião européia que se assenhorou do território conquistado. As divindades indígenas foram miscigenadas aos santos católicos, para que assim, aquela comunidade pudesse absorver tradições cultuais e serem cristianizados. Hoje, tanto no México como nos andes, no Peru e até mesmo no Brasil, divindades africanas e indígenas se misturam ao panteão da agiolatria católica.

            Ainda hoje se pode ouvir o som dos canhões de Cortez soar sobre a cultura latina assustando os nativos que desconheciam o poderio bélico de tais armas. Não são tiros impulsionados por pólvora, mas a discursos de unidade econômica e política que, no fundo, busca uma dominação através da coerção do embargo econômico e da violência moral indiscriminada.
            A Europa conquistou e impôs seu domínio. Certamente que nem todos habitantes da América espanhola ou portuguesa se renderam passivamente ao invasor, mas aos poucos foram se habituando ao domínio do feitor. Porém, mesmo a contra gosto, se tornaram reféns e escravos de uma sociedade que se achava superior. Hoje a América Latina se põe em uma situação que, por fatores psicológicos de sua história no passado, pela herança colonial que trazem consigo, tende mais uma vez a submeter-se aos demando dos poderosos.

 BIBLIOGRAFIA

DONGHI, Túlio Halperin. – História da América Latina; Circulo do Livro;
ELLIOT, J.H., BERTHEL, Leslie (org) – História da América Latina: A América Colonial I; Ed. USP; 2. Ed.
TODOROV, Tzevetan. – A Conquista da América: A questão do outro; Ed. Martins Fontes;        



[1] TODOROV, Tzvetan – A conquista da América – a questão do outro; Ed. Martins fontes; p.51.
[2] ELLIOT, J.H. p. 162
[3] Idem p. 160
[4] Idem p. 163
[5]  Idem p. 162
[6] Idem
[7] TODOROV, Tzvetan – A conquista da América – a questão do outro; Ed. Martins fontes; p
[8] Idem p.53
[9] Idem p.55
[10] Idem p.62
[11] Idem
[12] Idem p.67
[13] Idem p.72
[14] Idem p.73
[15] Donghi, Túlio Halperin – História da América Latina; p. 12
[16] Idem p.14
[17] Idem p. 18
[18] Idem p. 37
[19] Idem p.20
[20] Idem p. 57
[21] Idem p.60

Sobre o Autor
Bacharel em Teologia formado na FAESP;
Bacharelado e Licenciado em História pela FIEO;
Palestrante, Conferencista em diversos eventos;
Professor de Teologia (IETEB - Osasco/ ITF - Embu);

Escritor de apostilas utilizadas na grade do IETEB, conforme abaixo:

- Curso Básico:  Introdução Bíblica; Antigo Testamento; Novo Testamento;
- Curso Médio: Cristologia; Livros Poeticos; Período Interbíblico
- Bacharel: Cristologia; Livros Poéticos;
- Outros: Bibliologia Geral; Arqueologia Bíblica;
Escritor de diversas Apostilas usadas em Palestras, Estudos e Seminários. Entre outros títulos, citamos: Escatologia; O Adolescente; Laços do Passarinheiro (voltado aos jovens); Liderança/Líder/Relacionamento com o Grupo; Não Sejais Meros Ouvintes (Estudo no Livro de Tiago).
Email: pr_robert@itelefonica.com.br